
O processo é parte da cura, na verdade o processo é tudo, pois não há cura, há convívio.
É tão estranho e normal pegar a estrada e pensar somente no destino final. Toda paisagem ignorada é alimento desperdiçado.
Algumas paisagens me mostram pessoas imersas em ciclos doentios, sem nem buscar mais um convívio harmônico. O desejo é de alívio. Pensar em sair do ciclo é uma dor a mais, um projeto a mais, é alocar energia que não se tem. Segue o ciclo e espera um acaso qualquer.
O amigo psiquiatra e Psicoterapeuta do Encantamento, Paulo Urban, publica em seu perfil que está há 36 anos sem sequer receber visitas de representantes de laboratórios de novidades cosméticas da mente.
Num momento da história humana em que qualquer desconforto tem diagnóstico e pílula, é um alento ver resistência. “Encantamento” é sua palavra de resistência.
(É preciso fazer a ressalva óbvia e anti plantão de que há quem precise da química, aqui se fala da banalização.)
Uma vez li: “A felicidade não é um lugar, é um caminho.” A busca pela felicidade é superestimada, concordo com o Contardo Calligaris que há coisa melhor para fazer com a vida do que ficar buscando a felicidade.
A busca pela felicidade foi cooptada pelo comércio e pela publicidade.
Só vou ser feliz quando… só vou ser feliz se… serei feliz quando tiver…
Não se pode ser feliz por comparação, por ilusão, por compulsão. Pular de alívio em alívio não é ter momentos felizes, é despressurizar.
Epicuro dizia que a felicidade é um bichinho tímido, quando o percebemos ele se esconde. De fato, se estivermos vivendo um momento legitimamente feliz e pensarmos nele – que vai acabar, se é realmente um momento feliz, por que são raros estes momentos, se pensarmos o quão simples eles são – lá se foi a felicidade, espantada pela lógica.
A corrente de pensamento que Contardo Calligaris defendia prega que em vez de ficarmos buscando a felicidade deveríamos nos focar em ter uma vida interessante. Uma vida interessante é aquela que vive todos os momentos, mesmo a dor. Uma vida que observa, aprende, absorve, que se encanta. Uma vida que não está focada no destino, mas aproveita cada passo.
E é interessante pensar que tudo é interessante. Se me irritei, não é interessante pensar no porquê? Como uma situação ou pessoa tem este poder sobre mim? Que porta é esta que deixo aberta para que remexam na minha química?
Se me sinto desmotivado, não é interessante pensar em tudo que tenho? Pensar em como me motivaria? Quem sabe testar uma coisa nova?
Há um capítulo do livro “O sentido da vida” (do Contardo) que fala que a morte de um ente querido é um dia que deve ser vivido, ele só vai acontecer uma vez.
Buscar a felicidade é muitas vezes uma desculpa para procrastinar decisões difíceis, ou nem tão difíceis, talvez só diferentes.
“Felicidade” , “Cura”. Conceitos que não deveriam nos pertencer. Somos imperfeitos, doentes e contraditórios por definição, e isso nos faz muito interessantes.
Thank you!